Com a devida vénia, transcrevo a parte de um texto de Miguel Monjardino, publicado no Expresso de sábado, referente à civilização, cultura, investigação científica no mundo islâmico . Os destaques são meus.
Deve ser lido (e meditado) pelos meus amigos que, quando se fala em árabes, fazem um ar sonhador e lembram a sua liderança nas artes e nas matemáticas há uns bons 1000 (MIL) anos.
Ok, John Kings? (um abraço!)
Não percam!
"Durante décadas soubemos e interessámos-nos muito pouco por aquilo que se passava no vasto e diverso mundo muçulmano. Durante esses longos anos, as únicas coisas que nos interessaram de uma forma consistente nesse mundo foram o duro conflito político e territorial entre palestinianos e israelitas e o preço do barril do petróleo. O resto era uma espécie de terra incógnita, distante e irrelevante. O 11 de Setembro mudou este estado de coisas.
Os ataques desse dia tornaram os países e sociedades muçulmanas muito mais transparentes. A transparência, por sua vez, mostrou-nos coisas muito interessantes. E perturbantes, também. Veja-se o caso da investigação científica. Esta semana vale a pena relembrar que Bagdade foi o maior centro de investigação científica mundial no século IX. E, pelo menos até ao século XII, o Islão foi líder na investigação científica. Os séculos seguintes foram simplesmente desastrosos. Do centro, o Islão passou primeiro para a periferia da ciência. E a seguir tornou-se irrelevante.
Em 2002, o relatório da ONU sobre o Desenvolvimento Humano Árabe foi particularmente claro em relação à dimensão do enorme falhanço dessas sociedades ao nível científico e cultural. 'Todo o mundo árabe', dizia o relatório, 'traduz cerca de trezentos e trinta livros por ano, um quinto do número de livros traduzidos na Grécia'.
O relatório chamava ainda a atenção para o facto de nos mil anos que se seguiram ao esplêndido século IX os Árabes terem traduzido o mesmo número de livros que a Espanha traduz num ano.
Em 2003, o segundo relatório sobre o Desenvolvimento Humano Árabe reconhecia a existência de um 'fosso de conhecimento' entre os países desenvolvidos e os países árabes e recomendou uma série de medidas para melhorar a situação. Quatro anos depois, continuamos à espera da renascença científica árabe. Porquê?
Num ensaio publicado no número de Agosto da revista 'Physics Today' (
www.physicstoday.org ), Pervez Amirali Hoodbhoy, director do Departamento de Física na Universidade de Quaid-i-Azam em Islamabade, Paquistão, defende que não é só o mundo árabe que está decadente do ponto de vista científico. Para o reputado professor paquistanês esta decadência abraça todo o mundo islâmico contemporâneo.Uma comparação com o Brasil, Índia, China e EUA ao nível da publicação de ensaios e citações académicas mostra um atraso muito substancial do mundo islâmico. Comparados com os 30 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), os cinquenta e sete países da Organização da Conferência Islâmica (OIC) têm um número extremamente baixo de cientistas, engenheiros e técnicos. O número de patentes produzidas durante as últimas décadas nos países da OIC é simplesmente ridículo. Apesar de existirem cerca de mil e oitocentas universidades no mundo islâmico, nenhuma delas figura na lista das quinhentas melhores universidades mundiais compilada pela Universidade Jiao Tong em Xangai.
Como se isto não fosse suficientemente mau, a liberdade académica e cultural nas universidades islâmicas continua a ser severamente restringida. Hoodbhoy escreve que na sua universidade, a segunda melhor universidade da OIC, existem três mesquitas mas não há uma única livraria. Abdus Salam pode ter ganho o Prémio Nobel da Física em 1979 mas, como as suas crenças religiosas foram declaradas heréticas pelo Governo paquistanês em 1974, nenhuma universidade paquistanesa aceitou recebê-lo nas suas instalações até à sua morte.
Hoodbhoy conclui que a ciência não regressará ao mundo islâmico enquanto não forem levadas a cabo profundas reformas políticas e religiosas nos países da OIC."
Miguel Monjardino
2 comments:
Cumprimentos Doutor,
Para seu esclarecimento quanto às eventuais simpatias que um reconhecido ateu, como julgo que saiba que eu sou, possa eventualmente ter pelo Mundo Islâmico (efectivamente um verdadeiro atraso de vida), aqui lhe deixo a seguinte história:
Certo árabe casou a filha;
um dia esta apareceu-lhe em casa toda chorosa, dizendo:
- Pai, o malandro do meu marido bateu-me!
Aí o pai deu-lhe uma sonora bofetada.
- mas pai, porque fizeste isso?
Resposta do árabe:
- Esse malandro bateu na minha filha, pois agora vais ter com ele e dizes que acabei de bater na sua mulher! Eis-me vingado!
Cumprimentos,
Caro Kings,
só agora vi a tua msg. Para já tenho é que ir à tertúlia e chegar-me à frente com os aéreos...
Um abraço!
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